O que se perdeu?
Na história da filosofia moral há uma
ruptura perceptível em sua estrutura e em seus princípios de ação. Isso nos
permite indagar sobre o que se perdeu para que essa cisão tenha ocorrido.
A filosofia moral clássica (grega) é
marcada pela busca incessante de um sumo bem, o qual deve ser alcançado através
da forma como o homem agia. Os filósofos de tal época sempre questionavam qual
era a maneira mais adequada para agir a fim de chegar a esse bem ideal. Além do mais, eles estabeleciam
sempre ações que, aos seus olhos, eram justas e virtuosas com a finalidade de
segui-las e, dessa forma, chegar a um objetivo traçado, quero dizer, a um
objetivo estipulado por eles como o correto, bom e fim último.
Esse Bem era uma ideia que foi fundada, por assim dizer, pela própria autonomia dos
filósofos daquela época. A filosofia clássica não sofria influência da religião
nem da crença nas divindades. Tal religião tinha apenas caráter cívico, isto é,
o povo grego participava ativamente das questões políticas e sociais da pólis.
Com o advento do cristianismo, e depois
com sua fragmentação, a filosofia moral passou a estar encravada na moral da
Igreja. O homem passou a agir de acordo com sua necessidade de crença na
Salvação pós-morte, eterna. Suas práticas não mais tinham como base e como
origem sua capacidade de enxergar uma ética voltada para o todo, e sim, via apenas
ele mesmo como agente e paciente. Agente pelo fato de ser autor de suas ações;
paciente porque ele mesmo sofreria as benesses daquelas.
A moral da Igreja talvez não seja de
todo errada, mas, de fato, tirou do homem a capacidade de agir conforme a
necessidade da sociedade, da população, do todo. Agir moralmente é muito mais
que apenas se autoglorificar: é glorificar o todo, mas isso sem a ambição de
estar contribuindo para seu suposto bem-estar além-vida.
Onde, portanto, se perdeu a autonomia do
homem diante de suas práticas morais? Como se permitiu deixar sua
potencialidade de decisão e de discernimento para voltar-se a princípios
regidos pela conveniência da Igreja? Será mais plausível pensarmos
semelhantemente aos antigos ou seguirmos critérios arbitrários alicerçados numa
moral religiosa? Onde ficou o intelecto que permite o homem Pensar?
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