Escrever

Clausura

Lá fora estão todos os anônimos e também os homens de grife. Aqui estou eu. Enclausurado. Diante deste texto. Ou melhor, diante da ideia deste texto. Pois, ainda não é um texto. Só ao final que será. Aliás, de que seria este texto se não houvesse eu aqui, num cubículo, sozinho, para escrevê-lo!? Penso que os enclausurados, numa clausura deliberada, são necessários à humanidade.

Se escolho estar aqui, é porque vejo nisto um sentido. O que seria da minha vida se eu não lhe desse um sentido? Os enclausurados também têm sentido. Não apenas os homens de glamour. Nem apenas de prisão eu vivo. A prisão é apenas parte da minha existência pessoal, assim como sua possível negação a isso também a é para você.

Se sou tão sozinho entre multidões ao meu lado, não me diferencio em muito daqueles que fazem parte da multidão. A maior solidão é aquela que se esconde em nós mesmos. Aquela solidão que quando deitamos enche-nos de angústia, mesmo após ter estado entre dezenas de amigos. Se mantivermos uma saúde emocional, nunca estaremos realmente sozinhos. O maior bem-estar é de dentro para fora, e, não, de fora para dentro.

Fugir deste texto, deste computador, deste café, não amenizará minha clausura espiritual. A clausura física pode até desaparecer. Mas, mais tarde tenho de voltar. E aí? Estarei, com certeza, mergulhado novamente na angústia. Mas a angústia é apenas o sentimento do desejado não alcançado. Por isso, não vivo desejando. Apenas vivo. Vou vivendo. Vou (con)vivendo. Vou criando. Criando caminhos. Oportunidades. Mas, oportunidades de quê, se eu não desejo muita coisa? Oportunidades para que eu durma e amanheça com a mesma capacidade de continuar vivendo.

Angustia-me aquilo que eu almejo e não alcanço. É como se fosse um lapso existencial. Uma fratura na continuidade da vida. No entanto, continuo vivendo. A angústia passará por alguns instantes. Só não se esvanecerá para sempre. Porque a angústia é o impulso a viver. E, se vivo, é porque todo dia luto contra ela. E viver é se reconstruir após cada lapso deste. 

Este movimento contínuo se passa, em sua maior parte, na clausura do meu ser e na clausura das paredes que me circundam. Por quê? Porque minha angústia vive em mim, também enclausurada. O primeiro trabalho a se fazer é de dentro para fora, assim como estou aqui dentro escrevendo para você, que está aí fora.

Comentários

  1. Denis existêncialista, gostei de sua postagem. Sem angústia não temos impulso de vida mas ela incomoda bastante. Responda-me por favor, será que o engamento em causas plausíveis à alma não seria apenas uma maneira de buscar ainda mais angústia? E se ao conseguirmos o que almejamos, a angústia não muda sua forma uma vez que estamos sempre com a sensação de incompletude? Abraços
    Abenício Júnior.

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    1. Muito obrigado, Júnior. Creio que seja um leitor assíduo.

      A sensação de completude parece nunca nos afetar, uma vez que ser completo, creio eu, é não possuir mais nada a se buscar. Assim, como prosseguirmos com o sentido da vida?

      A incompletude é parte da angústia, assim como esta é parte inerente da vida. Não acredito que consigamos obter uma sensação de completude duradoura. Talvez tenhamos em algum aspecto particular, mas não universal.

      Bom... Este é meu ponto de vista. Não é baseado em nenhuma teoria filosófica.

      Abração e obrigado pela assiduidade no Blog!

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