A linha tênue entre a vida e a morte

A vida, mesmo muito dura de se viver, ainda não nos espanta tanto quanto a morte.

O que, ao meu olhar, faz uma outra pessoa estar viva? Talvez não seja exclusivamente a evidenciação dos seus batimentos cardíacos ou a certeza de o cérebro ainda estar funcionando. O que, para mim, faz com que o outro esteja vivo é que ali ainda respira um resquício de subjetividade. Talvez seja porque eu espere dele uma ação intencional, uma esperança de relação entre nós. A fuga que eu, outrora, poderia empreender àquela pessoa agora não é mais possível.

Quando esta possibilidade cessa, quando o “corpo sujeito” passa a ser totalmente um “corpo objeto”, deparo-me com a dura realidade de dali não esperar mais nenhuma ação ou reação. Estou diante de uma inação, de um corpo que antes poderia ser minha referência e que agora não o pode ser mais. A sensação de impotência angustia-me.

É um abismo entre a pessoalidade e a impessoalidade resumida a um mero corpo objetificado — uma coisa qualquer. Toda a amplitude de uma subjetividade se esvai. Aquele corpo que se movia, que se relacionava com o mundo e com os outros tornou-se uma coisa acabada para mim, no sentido de que o é, agora, um ser “totalizado”, que não tem mais sua abertura enquanto subjetividade. Eu não posso mais “ser-para-ele” e ele não pode mais “ser-para-mim”.

É a cisão que nos choca. É a incompreensão de uma atividade plena para uma passividade completa. É a intencionalidade transformada em apatia.

Cabe-nos entender que somos seres-para-a-morte. A morte não é apenas um evento empírico que se abate sobre nós: ela é, paradoxalmente, parte de nossa existência. Nós somos a nossa própria morte: nos encaminhamos, irremediavelmente, para ela. Se nos compreendermos enquanto esta possibilidade, poderemos nos confortar com mais facilidade a este fato.

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