Absolutismos

Nasci em um mundo já formatado física e culturalmente, embora esta última esteja em constante mudança. Sempre fui impelido a acreditar que eu, enquanto ser humano, era especial. Que eu me encarnei a fim de alguma missão prescrita por algo Absoluto.

Fui educado, no sentido amplo do termo, numa propedêutica de cultuar aquilo que é extramundano — seja em sentido Teológico, seja em sentido Humanista, seja em sentido Intelectualista. Cresci com a perspectiva de ser, de alguma forma, superior e distante de tudo o que me circunda. Superior e distante no que se refere, de um só golpe, a “digerir” o mundo que está à minha volta e compreendê-lo, como se eu o fosse exterior.

Nunca me avisaram, no entanto, que eu também sou este mundo. Que eu também sou a relação para com ele e para com os outros. Que eu, junto com tudo o que me está ao lado, produzo a dialética mundana. Que, sem mim, o outro, e eu mesmo, não nos formamos. Que o mundo é o pano de fundo sem o qual não existo enquanto um Eu e um ser cultural.

As misérias do mundo se devem, em grande parte, aos absolutismos impostos pela humanidade: principalmente, o Absolutismo teológico e o Absolutismo humanista. Quando se atribui a existência humana a um Absoluto, esquece-se da trama existencial necessária à historicidade e, portanto, à formação do indivíduo. Uma trama, neste sentido, sempre bilateral. Todavia, não há ser sem mundo, porque o mundo não é extensão do homem, mas, parte dele.

Esquecem do homem em detrimento de Deus e esquecem do mundo em detrimento do Homem (Teologia e Humanismo, respectivamente). O tecido da existência não é concebível a partir de uma ótica única. Nem Deus, nem Homem, nem Natureza visados separadamente como polos Absolutos. A existência é um conjunto; uma conjugação indistinta entre natureza e homem. A linha que distingue ambos não pode ser precisada, porque em toda subjetividade há resquícios da natureza cultural que é arada no campo da mundaneidade efetiva.

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