A PERSISTÊNCIA DA MEMÓRIA | Salvador Dalí |
Cronometrar o tempo é torná-lo extrínseco a nós, ou seja, é tentar enxergá-lo como algo que nos escapa e, portanto, que não está conosco. Medi-lo torna-o, portanto, quase que palpável; o traz para o nosso controle e o coisifica. No entanto, o tempo não se distingue daquilo que somos. Ele é uma dimensão nossa, a qual nos permite ser este projeto. Isto é, não concebemos o Ser destituído da dimensão temporal.
Seguindo este raciocínio, não há “tempos”. O que existe é uma dimensão que é igual para mim, para você e para outro, porque o tempo é o desenrolar de nossa existência. Assim, quando Einstein afirma, em sua teoria da relatividade, que o tempo de um observador A dilata-se ou retrai-se em relação ao tempo de um observador B, a uma determinada distância, ele não atenta para o fato de que esta afirmação supõe a diferença entre tempos simultâneos. Dessa forma, o tempo fica compreendido como a particularidade de cada um, ou seja, relativo.
Mas, como o filósofo francês Merleau-Ponty afirmou, em Einstein e a Crise da Razão, o tempo verdadeiro é o único que é “sucessão, devir, duração, [...] do qual temos experiência ou percepção antes de toda a física”. Quer dizer, assumir a relatividade do tempo é esquecer-se da sua própria condição temporal para tal exercício. Em outras palavras, o sentido de passado, presente e futuro se tornaria irrelevante porquanto poderíamos perceber sujeitos em todos os tempos de uma só vez. Se assim o ocorresse, nossa existência sucumbiria em um irracionalismo inexplicável, porque perderíamos o rumo da história.
Por fim, eu, enquanto observador de um outro sujeito que está distante de mim, não o concebo em outra medição de tempo, nem ele a mim. Ambos somos e estamos sob a mesma duração e sob a mesma simultaneidade. Ele não percebe a mim nem o mundo diferentemente da minha percepção – nem eu também da dele. Estamos enredados numa temporalidade única e indiscernível de nós mesmos enquanto relativos um ao outro.
Comentários
Postar um comentário