O superficial e a efemeridade

MELANCOLIA | Edvard Munch
Por que estamos tão superficiais e efêmeros em nossa relação com o mundo e com outrem? Superficiais porque deixamos de pensar os problemas e nossa própria existência. Efêmeros porque, tão logo alcançamos uma finalidade, esta já passa a ter uma função de meio. Ou seja, as relações tornam-se apenas “degraus” para um novo e diferente fim.

Ao ler a obra Arquivida: do senciente e do sentido, do filósofo francês Jean-Luc Nancy, deparei-me com esta reflexão: a de que, hoje, os fins se tornam rapidamente meios.

Esta dinamicidade se deve, em grande parte, à tecnização irrefletida, isto é, a técnica traz em si um movimento de ilimitação em seu funcionamento. Esta atividade ilimitada quer dizer que, a cada movimento executado, a técnica produz novos fins a serem buscados, tornando-a, desse modo, um motor incessante. Para isso, é preciso que haja discernimento a fim de sabermos até onde podemos ir e qual o grau de benevolência ou nocividade.

A rapidez e a superficialidade deste movimento tecnicizante provocam uma perda de reflexão em detrimento da alta “rotação” de finalidades objetivas – finalidades essas que não passam de estágios entre um momento e outro.

Em meio a tantas máquinas, estamos perdendo o rumo de nós mesmos. Estamos cada vez mais cercados de pedaços e fragmentos do mundo que são produzidos todos os dias com a única pretensão prática do aqui e agora. Perdemos a noção do universal, do todo, do conjunto, do outro e até de nós mesmos. Somos, todos os dias, “manipulandos” de novidades tecnológicas.

Respondendo, portanto, à pergunta do início do texto: a superficialidade e efemeridade de nossas relações estão arraigadas na consequência da irreflexão, promovida pela incapacidade de a técnica tapar o oco da existência humana. Como afirma Nancy, a técnica está cada vez mais intrínseca apenas a seu objeto.

A “robotização” da humanidade, juntamente com a negligência do pensar reflexivo, nos levará à decadência do homem. A amplitude humana é genérica, enquanto a da técnica é específica. Isto é, esta última está relacionada apenas consigo – seus problemas remetem-se a seu próprio modo de operar.

Comentários

  1. Concordo plenamente, inclusive, quem trata deste assunto de forma clara e prática, corroborando com seu pensamento, é vosso colega Mário Sérgio Cortella no livro Não Nascemos Prontos.

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  2. Cortella tem uma ação muito boa, que é trazer ao grande público problemas filosóficos de forma simples.

    Obrigado pela dica, Francinha!

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