Um ato cidadão

O ASTRÔNOMO | Johannes Vermeer
Como no caso do alvoroço que um telescópio causa, ao captar o eclipse de nosso satélite natural, levado àqueles que nunca dispuseram de tal instrumento, a difusão do saber e das descobertas podem fazer o mesmo efeito.

Como na ágora da Grécia antiga, a “praça pública” de hoje pode ser ambiente de divulgação do conhecimento. Nela, se pode falar, expor e levar o entusiasmo da sabedoria, da ciência e até mesmo das experiências humanas mais cotidianas.

É preciso que o conhecimento saia da sua clausura – que, em certo grau, insiste em se manter – das castas universitárias. Que chegue à população sedenta cada vez mais por informação, alimentada pela curiosidade que a impulsiona para além das paredes de sua casa ou dos limites de sua cidade.

Embora já emancipados em diversas áreas e temas, libertos dos obscurantismos de outrora, precisamos nos reportar para a revolução intelectual que banhou a Grécia clássica. Revolução alavancada pela busca incessante de princípios regentes de toda a existência e fins a serem almejados.

A educação cultural e espiritual deve ser um empreendimento contínuo e globalizante. Por muitos séculos a sabedoria foi apenas destinada às elites, para que continuassem a dominar os ignorantes sem acesso a ela.

Mesmo na ágora grega, berço do saber ocidental, a sophia era privilégio masculino e de cidadão ateniense. Mulheres, estrangeiros e escravos não tinham acesso aos encontros públicos ou, pelo menos, não tinham vez nem voz. No entanto, a referência a esta época baseia-se no fato do comprometimento social daqueles que se empenhavam em realizar a práxis da sapiência.

Esta “educação prática” é aquilo que Werner Jaeger afirma na Introdução de sua Paideia: “uma educação consciente pode até mudar a natureza física do Homem e suas qualidades, elevando-lhe a capacidade a um nível superior. Mas o espírito humano conduz progressivamente à descoberta de si próprio e cria, pelo conhecimento do mundo exterior e interior, formas melhores de existência humana.”

É neste tecido interior-exterior que nos formamos. Assim, se esta imbricação for empobrecida, ou seja, se exercer vivências muito limitadas, naturalmente a relação do indivíduo com a sociedade torna-se distante.

Esta elevação do indivíduo e, consequentemente, da sociedade é alcançada pela propagação da ciência, em todas suas ramificações, da filosofia, da sociologia, da política, etc. Tudo isso num ato inclusivo, amplificado, que chegue até os recônditos mais remotos.

Só saímos da mediocridade quando enxergamos o alvorecer de tudo aquilo que já foi conhecido. Além desta aurora, é preciso que saibamos usar esta “iluminação” para empreendermos em novas formas de vida ou de seu aperfeiçoamento.

É preciso despertar uma consciência social, cultural, científica e filosófica, que destrua os preconceitos e os alicerces que sustentam as desigualdades de todos os tipos. Se não destruí-los por completo, que ao menos se reduzam a meras especulações.

Portanto, um ambiente para todos, de transmissão mútua, de debate e de esclarecimento àqueles mais excluídos faz-se necessário para a construção de um povo digno e igualitário. É a promoção da cidadania.

Comentários

  1. Considerado local de produção e socialização do conhecimento a Universidade dorme o sono esplêndido do saber fragmentado voltado somente para técnicas. Professores como esses, mudos ou dedicados ao interior dos muros não vão permitir que se cumpra o papel transformador e libertador das Universidades. Professores que apenas reproduzem conhecimento do séculos passados são apenas livros empoeirados nas prateleiras. livros que nem mesmo a menina que roubava livros vai querer ler. Assim caminha a Universidade em fotos e fatos que nos envergonham.

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