A degradação humana

A MENTE INVISÍVEL | Gil Bruvel
Será que estamos preparados para a avalanche que a ciência afetará em nós? Se a evolução tecnológica não vier acompanhada de um pensamento sobre o mundo humano, correremos o risco de sucumbirmos num vazio de sentido tão intenso que seremos obrigados a nos transformarmos também em máquinas.

Essa não é uma constatação nova. Tal transição já começa a apontar no horizonte científico. Exemplo disso é a constante pesquisa da neurociência sobre o cérebro e a mente, a fim de mapear todo o nosso aparelho psíquico para replicá-lo.

A supervalorização da tecnologia transcendida à vida – quando a ciência é usada para substituir o efetivamente humano pelo efetivamente artificial – gera a recusa de o ser humano pensar a si mesmo.

Quando os cientistas “matematizam” a nossa existência – ou, ao menos, quando pretendem fazê-lo – excluem da alçada da reflexão o mundo propriamente humano: a ética, a questão do outro, a política, etc., tornam-se meros acessórios que só passam a ser pensados (tomara!) posteriormente.

Os anseios dessa ciência que ambiciona a superação do humano – almejando uma “super-humanidade”, baseada no conserto de suas falhas cada vez mais aperfeiçoado – criam um contexto absolutamente novo para nós, uma vez que os produtos criados por essa cientificidade nos são completamente alheios, mesmo que sejam feitos para nós.

Cria-se algo de extra-humano para só depois nos adaptarmos a ele. Assim, o pensamento acerca da nossa humanidade obscurece-se em detrimento do apenas pensar o aperfeiçoamento da máquina.

Extinguindo a reflexão sobre o Eu, sobre o que nos torna humanos, necessitaremos de nos tornarmos máquinas, tendo em vista que todo o pensamento convergirá para a evolução tecnológica. Esta convergência não dará espaço para refundarmos uma visão filosófica do ser humano; essa última já terá se tornado obsoleta, em desuso.

O humano se tornando filosoficamente antiquado, só restará tratá-lo como um novo “ser tecnoloide”, servo dos avanços científicos. Será preciso reformular todo o caráter da nova existência.

A reflexão que deixo é: mesmo se nos tornarmos tecnoloides, como nos relacionaremos com a questão social? Para pensar o social é preciso que se pense o papel do indivíduo enquanto agente. Para pensar fundamentalmente um agente, é imprescindível que se pense o que é esse ser humano que age. Contudo, diante do exposto, como pensar o ser humano se seu sentido foi radicalmente alterado?

Portanto, um pensamento basilar, que acompanhe toda essa aurora cientificista, é necessário para que não fiquemos boiando na superfície do vazio que nós próprios o deixamos emergir.

A degradação humana se dá justamente no obscurecimento de si para a passagem àquilo que será transmutado de nós.

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