O invisível da vida


O JARDIM DAS DELÍCIAS TERRENAS (detalhe) | Hieronymus Bosch
Uma das perguntas existenciais mais intrigantes que há é: “por que a vida vale a pena ser vivida?”.

Se tentarmos respondê-la por meio de explicações pessoais, caímos num relativismo insuperável e tal questão se tornará apenas de cunho particular de cada um. Mas, a filosofia é uma tentativa de superar esta barreira do relativo e conceber o sustentáculo comum.

Penso que não podemos resolvê-la relativamente, ou seja, explicando-a pelas perspectivas de cada um.

Aqui não tenho o propósito de defini-la, mas unicamente de pensar suas bases.

Também penso que é interessante respondê-la, porque somos conscientes dela. Ter consciência dela e fundamentá-la é o primeiro passo para a recusa do suicídio.

Ao pensar nessa questão, estamos em um estágio distinto dos outros animais. Nossa existência não se baseia mais simplesmente na perpetuação da espécie, de forma irrefletida. Há um processo e uma dimensão de sentido.

O sentido é preciso estar assentado em algo que não ele próprio. Porque, se assim não fosse, ele deveria ser em si mesmo. Se isso fosse o caso, o sentido não poderia “assessorar” a existência daquele que o usufrui, uma vez que seria por ele e para ele.

Em outras palavras, o sentido só é possível quando é fundado numa existência que o torne indispensável. Mas, aqui reside o problema: como a existência humana recorre a um sentido para valer a pena ser vivida?

Há uma consciência prévia e turva de que interligamos um ser, mais fundamental e maior que nossa limitada situação. Essa consciência necessita de um sentido para que não se pulverize na insondável presença do mundo e do outro.

A partir do sentido dado – e é aqui que recai todo aquele relativismo de que cada indivíduo tem um motivo que o faz tocar sua vida – nasce a esperança. Sem o sentido, a esperança é vazia, pois não teria o que esperançar, tendo em vista que o sentido é o que dá forma à esperança.

Só há esperança quando um sentido é anteriormente atribuído. Por isso as religiões têm o poder fascinante de conversão. Por exemplo, de forma muito simples, para elas, Deus é o sentido primeiro e último: dele decorre todo o Bem, e, a ele, as criaturas caminham. Assim, a esperança, de certa forma, é a crença na ação do sentido divino.

A pergunta “por que tudo e não nada?” é a fagulha de uma compreensão que precede qualquer reflexão a partir dela. E essa compreensão abarca um sentimento de pertencimento íntimo ao todo que o consome.

Esta sensação de pertencer é o ou um dos pilares que sustentam a estrutura na qual o sentido de cada um ou de cada cultura se ergue.

Em suma, o sentido é aquele invisível latente que “autoriza” a validade da vida, mesmo que inconscientemente. Sua perda implica no desligamento do elo entre o sentir-se parte e o agir neste pertencimento.

Portanto, à pergunta do início do texto deve ser atrelada uma resposta que contemple não motivos superficiais da vida de cada um, mas algo que seja radical e subjacentemente humano. Tal questão só pode ser expressada e resolvida pelo e no homem, exclusivamente.

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