DESPREZO | William-Adolphe Bouguereau |
Assim é grande parte da Filosofia tratada hoje, pelo menos no Brasil: uma área do conhecimento que se enclausura em definições conceituais de indivíduos particulares.
O filosofar não caiu do céu. Nem brotou da terra. Foi pela força do pensamento humano que a filosofia se construiu como auxílio à compreensão do mundo. E o mundo, para os primeiros filósofos, não era uma abstração pura, mas o incompreendido que se dispunha à sua frente.
Na sua Filosofia como ciência rigorosa, Husserl nos mostra como a filosofia desenvolve um papel único na vida do espírito humano. Porque sua raiz se finca na experiência vivida, e esta última é uma consequência de nossa situação natural no seio do mundo.
Os métodos de compreensão dos filósofos é que são passíveis de crítica, mas nunca a razão de sê-los: os problemas vislumbrados.
Mas, hoje, a filosofia acadêmica não passa de seus muros, de seus artigos especializados e de sua referência a problemas extremamente pontuais: conceitos filosóficos de determinados filósofos.
Não que a filosofia se exima de definir conceitos. Esta é sua função elementar. É preciso que, somada às definições, haja a interpretação efetiva do mundo ou dos fatos a que se destina falar.
O círculo em torno de conceitos específicos de filósofos torna a filosofia estéril para a compreensão da realidade.
A visão de mundo filosófica requer da filosofia ou daquele que faz filosofia uma posição totalizante, isto é, pretende ser mais que uma postura unilateral e superficial de compreensão. Quer-se integral, global e de fundamentos sólidos.
Os conceitos, sem uso para uma compreensão total de um fenômeno, são inúteis.
Quando os pré-socráticos criticavam uns aos outros em relação à interpretação da natureza; quando Platão reformulava o pensamento pré-socrático e censurava a mitologia de Hesíodo e Homero; quando Aristóteles abolia o “mundo das Ideias” de Platão etc. não o faziam apenas opondo e construindo conceitos, mas, atrelado a isso, erguiam um pensamento novo e complexo de entender as coisas.
Os conceitos restritamente discorridos nos milhões de artigos acadêmicos dos periódicos parecem alimentar a sensação de que a filosofia trata apenas de termos, os quais nada ou pouco têm a ver com a vida vivida.
E o desprezo pela filosofia se agrava. Há pelo menos dois motivos para isso, em decorrência do “restritivismo filosófico”: (i) a sensação de inutilidade até para a formação humana e (ii) a ideia de que o mundo e os fatos não necessitam de uma interpretação filosófica, englobante.
É preciso que o filosofar reponha-se em seu lugar: dar fundamentos aos fenômenos dos quais discorre, sem se ater a meros conceitos de filósofos A, B ou C.
Os conceitos são base do conhecimento. Não são fins em si mesmos. Eles são meios pelos quais a realidade é exposta em sentidos filosófico, científico e até religioso.
É preciso tratar a filosofia com o papel que é dela de fato e de direito: ser um alicerce de compreensão de nossa experiência no mundo, sob pena de permanecermos desprezando-a.
Comentários
Postar um comentário