RETRATO DO ESCRITOR VSEVOLOD M. GARSHIN | Ilia E. Repin |
Há sempre um texto do homem próprio. E há outro do autor.
O homem próprio é o indivíduo das paixões, das frustrações, da vida cotidiana.
O autor é aquele da persona junguiana – a máscara social. Ele é voltado ao outro, ao público.
“Apenas é profundo, apenas é verdadeiro, o que escondemos. Daí a força dos pensamentos vis”, dizia Cioran.
A vida nua nem sempre convém ser exposta. Aos olhos do outro, ela pode ser o que, em muito, é: terrivelmente cruel e descabida.
Os textos dos homens próprios revelam aos outros a virtualidade de tudo o que vivem: valores, objetivos, definições.
A bengala do homem são suas ideias. O existencialismo tem a ousadia de explicitá-la. O pessimismo, de destruí-la.
O idealista recusa a contingência que o existencialista torna evidente.
O ideal ancora o espírito. O Espírito: Ideia. Ideias que ancoram ideia, portanto. Que aporia!
O contingente permite viver o homem. Este, só vive na sua contingência e na contingência das circunstâncias.
Nenhum homem vive o tempo todo no ideal.
Os defensores de Deus – a Ideia magna – também são homens vis.
Viver o dia a dia não tolera ideias imutáveis. Nem a do próprio Homem.
A humanidade, no geral, vive sem pensar a si mesma. Quando a pensa, não raro, perde-se a sua liberdade.
O que seria dos totalitarismos e das perseguições religiosas se não tivessem, nas suas motivações, idealidades insensíveis ao viver?
Quando o autor quer obcecar a baixeza da vida mesma, escreve o que os outros querem ouvir.
Os escritores marginais, que escrevem sobre as contradições humanas cotidianas, são os homens que se desnudam dos ideais de vida.
Quem vos escreve é o homem próprio. Sem intenção civilizatória ou humanizadora.
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