As implicações éticas da vacinação e da prevenção

O TRIUNFO DA MORTE |
Pieter Bruegel, o Velho
Uma passagem do filósofo francês Jean-Paul Sartre, contida em O existencialismo é um humanismo, sempre ecoou em minha mente, no que diz respeito ao senso ético. O pensamento do autor pode ser resumido assim: o homem é responsável por todos os homens.

Isto se refere ao fato de estarmos vulneráveis às circunstâncias mais corriqueiras do mundo concreto. Cada um é responsável por suas escolhas e pelos efeitos dela para com os outros, ao mesmo tempo. É nisso em que consiste o social.

Quando nos responsabilizamos por nossa própria vida, a do outro também entra em consideração, uma vez que a construção de uma sociedade depende do que cada um e todos fazem.

A imunologia e as políticas de imunização de uma população (aqui, sem se ater a conceitos ecológicos ou epidemiológicos) demonstram o papel das atitudes individuais e das ações profiláticas.

A imunidade de rebanho é mais que um conceito. É um fato sanitário. Isto é, em uma determinada população, se todos ou a maior parte estiver imune contra um agente infeccioso, a circulação deste último é limitada, uma vez que não encontra organismo suscetível – ou estes estão reduzidos. 

Essa informação implica em uma atitude ética. Se eu e outros em minha comunidade nos vacinamos, podemos proteger aqueles poucos que, por algum motivo, não foram cobertos pela vacinação. Isso se dá pelo fato de haver muito menos pessoas vulnerabilizadas.

Quanto menos exposição, menos circulação de um microrganismo.

Só há eficácia se houver uma proporção maior de indivíduos resistentes. E a tomada de decisão é sempre daquele que será imunizado. Por isso, manter-se disposto eticamente é também uma condição de responsabilidade.

Os responsáveis pela sanidade animal – tanto profissionais quanto produtores – também passam por essas questões. Afinal, a saúde única é um conceito que engloba a sanidade humana, animal e vegetal: proteção da vida como um todo.

Ser responsável por si é, então, ser responsável por todos que estão em torno, como bem defendeu Sartre.

Há muitos fatores que levam as pessoas a acreditarem que vacinas trazem problemas de saúde. A escritora americana Eula Biss, no seu livro Imunidade: germes, vacinas e outros medos, mostra alguns. Quase todos provenientes de informações falsas.

O papel dos agentes promotores da saúde coletiva também deve passar pelo alerta da beneficência vacinal. Assim, na base, se tornam possibilitadores da responsabilidade coletiva.

A “autorresponsabilidade” é um dever de cada um, mas seus efeitos são vividos coletivamente. Portanto, compreender-se enquanto rebanho, nesse caso, é imprescindível para a promoção e manutenção da vida.

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